No passado dia 16 de fevereiro de 2021 recebemos a Professora Doutora Margarida Pedroso Lima para mais um Encontro ao Serão da ATLAS – People Like Us. O tema do Encontro foi “Sexualidade depois dos 50”. Deixamos aqui algumas notas para quem não teve oportunidade de estar presente.
De acordo com Vilar (2003), até época recente, o modelo social dominante de valores e atitudes sobre a sexualidade era o “Modelo Reprodutivo”, o qual legitimava a vida sexual somente às funções reprodutivas, as quais só eram aceitáveis no contexto matrimonial. Os comportamentos sexuais não reprodutivos não eram moralmente aceitáveis e respeitados. E, porque as pessoas idosas já não estavam em idade reprodutiva (mesmo que os homens fossem férteis ao longo de toda a vida), a sexualidade, e especialmente a sexualidade feminina, era ignorada, escondida ou desrespeitada (Pereira 2010; Sanchez and Ulátia, 1998; Steinke, 1997).
O avanço do estudo da sexualidade humana, os debates públicos e os movimentos sociais em torno da sexualidade e dos direitos sexuais fizeram com que esta forma de entender a sexualidade fosse substituída por um novo modelo – um modelo recreativo e permissivo (Giddens, 1996; Cabral e Ferreira, 2010) e, neste novo contexto social e cultural, a vida sexual das pessoas idosas tem sido mais aceite e reconhecida.
No entanto, e apesar destas mudanças nas normas sociais e nas atitudes sobre a sexualidade, o modelo tradicional tem ainda muito peso entre as pessoas de idade avançada.
O Idadismo é um preditor negativo da sexualidade na velhice
Se aos 40 acharmos que a sexualidade vai decrescer com a idade é possível que aos 70 ou aos 80 não se tenha uma sexualidade ativa. Funciona como uma profecia que se auto cumpre em que quanto mais forte é a nossa crença maior a probabilidade de sofrermos com ela.
As nossas crenças enquanto comunidade levam a que adultos mais velhos encontrem dificuldades na expressão da sua sexualidade. As crenças podem limitar-nos e por isso é importante serem criados espaços de informação, desmistificação dos mitos e apresentação dos factos.
O que muda afinal com a idade?
O pico da maior parte das funções biológicas relacionadas com a idade ocorre antes dos 30 anos e declinam gradual e linearmente ao longo da vida. O declínio pode ser crítico sob condições de stress, mas normalmente tem pouco ou nenhum efeito sobre as atividades diárias. Portanto, as doenças, mais do que o envelhecimento normal, são a causa primária das perdas funcionais durante o envelhecimento.
Em muitos casos, o declínio relacionado com a idade pode ser decorrente do estilo de vida, comportamento, alimentação e meio ambiente, e, portanto, pode ser modificado. Importa referir que nem todas as funções estão em declínio e, sabesse hoje, que no que toca à capacidade de gestão emocional, existem melhorias significativas com a idade.
Os idosos relatam melhor bem-estar emocional do que os mais jovens – mesmo durante uma pandemia que os coloca em maior risco do que a qualquer outra faixa etária. Artigo original em Inglês: https://news.stanford.edu/2020/10/27/despite-covid-19-risks-older-people-experience-higher-emotional-well-younger-adults/
Os investigadores justificam esta melhoria por existir uma maior consciência da mortalidade e percepção da fragilidade da vida, o que leva as pessoas com idade avançada a viver o presente com mais intensidade, valorizando todos os momentos. A experiência de vida leva também a que exista um aumento da capacidade de antecipar e adaptar respostas emocionais. Diminui a frequência e a intensidade de emoções como a raiva e consegue-se encontrar um equilibrio emocional.
Isso significa que o sexo não muda?
Sim e não. Sabemos que tudo muda ao longo do nosso ciclo de vida, somos seres sexuais desde o momento em que nascemos mas a forma de vivenciar a sexualidade aos 5 anos é diferente aos 20, aos 40 e será certamente diferente aos 60, 80 anos. Do nascimento até à morte somos seres sexuais e passamos por vários processos adaptativos.
A vida sexual transforma-se constantemente ao longo de toda a evolução individual, porém só desaparece com a morte. (Myra e López, in Sexualidade Humana, 1993)
Um dos grandes problemas em questões de sexualidade é que a mesma é equacionada com a capacidade/frequência de relações sexuais, mas a sexualidade vai muito para além do coito. Somos seres complexos e expressamos a nossa sexualidade de múltiplas formas, desde a nossa identidade, a imagem que apresentamos, aos erotismos, a sedução, as carícias. É hoje cientificamente consensual que a atividade sexual e a satisfação com a mesma são benéficas para o bem-estar psicológico e físico em adultos em idade avançada, reduzindo o stress físico e mental decorrente de doenças associadas ao envelhecimento (DeLamater, 2012; Traeen B, 2017).
Se queremos ter uma sexualidade ativa aos 60, 80…. Há que praticar! A nossa função sexual está muito relacionada com a nossa saúde física. Hábitos de vida saudáveis levam a uma sexualidade positiva mais anos.
Referências
DeLamater, J. (2012). Sexual expression in later life: A review and synthesis. Journal of Sex Research, 49, 125-141.
Giddens, A.(1996) As transformações da Intimidade. Sexualidade, amor e erotismo nas sociedades modernas, Oeiras, Celta
Pereira, A.R. (2010) A Sexualidade na terceira idade: perspectiva do idoso institucionalizado, Dissertação de Mestrado disponível na Mediateca da Universidade Lusíada de Lisboa
Sanchez, F., Ulátia, J. ((1998) Sexualidade en la Vejez, Madrid, Pirâmide
Steinke, e. (1997) Sexuality in Aging: implications for mursing facility satjj, The jornal of Continuing Education in nursing, 39-6.
Traeen, B. (2017). Sexuality in Older Adults (65+)—An Overview of The Recent Literature, Part 2: Body Image and Sexual Satisfaction.International Journal of Sexual Health, 29:1, 11-21.
Vilar, D. (2003) Falar Disso, Porto, Afrontamento
Villaverde Cabral, M., Ferreira, P. (org) (2010) ) Sexualidades em Portugal, Lisboa, Bizancio
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