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Velhos Amigos Alcobaça

O Projeto Velhos Amigos abre-nos as portas para experiências únicas e incomparáveis, permite-nos vivenciar as mudanças dos nossos Velhos Amigos e as mudanças que acontecem connosco. Proporciona momentos de alegria partilhada ou de tristeza dividida que nos enriquecem a todos e contribuem para uma construção pessoal e social mais coesa.

Os primeiros meses deste projeto no Município de Alcobaça já nos permitiram formar família com os beneficiários, ultrapassando as desconfianças iniciais e instituindo dinâmicas estruturantes. Esta criação de laços, permitiu-nos encontrar soluções para questões habitacionais ou de saúde que necessitavam de respostas urgentes. Com a colaboração de Voluntários e de Empresas presentes na Comunidade envolvente, foi possível substituir mobília e eletrodomésticos, forrar o telhado, criar um sistema elétrico de raiz, providenciar óculos novos, fornecer roupa nova, entre tantos outros pequenos mimos que foram surgindo naturalmente entre pessoas que se conhecem, que se gostam e que se respeitam.

As mudanças positivas que observamos nos Beneficiários fazem-nos acreditar que estamos a trabalhar no caminho correto, com consciência de que nos encontramos permanentemente em aprendizagem.

Iniciamos a 18 de setembro a Equipa 2, com o mesmo entusiasmo inicial, porque é muito bom ver a família crescer e perceber que estamos a chegar a quem precisa de nós e que no combate à solidão faremos tudo o que estiver ao nosso alcance para vencer. Vamos também agora consolidar a presença, na visita aos Beneficiários, de adolescentes, atletas do CRP Ribafria, com o intuito de irmos familiarizando os mais jovens com o voluntariado como prática social.

Ao avançarmos pouco a pouco, somos levados a refletir sobre o que tem sido a experiência neste projeto e a palavra que me surge constantemente é “obrigada”. Sem qualquer ordem específica:

Obrigada à Direção, às Coordenadoras e às técnicas que estão sempre na linha de apoio prontas a entrar em acção.

Obrigada aos beneficiários que partilham a sua história de vida de uma forma tão autêntica e que nos recebem de braços abertos fazendo-nos sentir sempre bem-vindos.

Obrigada aos restaurantes que, com um esforço acrescido em tempos de pandemia, não esquecem o seu papel na construção de um mundo melhor e tudo fazem para que este Projeto funcione.

Obrigada às Empresas que têm colaborado connosco, ficamos verdadeiramente emocionados com o carinho com que os nossos pedidos têm sido atendidos.

Obrigada aos Voluntários que com empenho, coragem e compromisso têm cumprido muito mais que a sua missão.

Acredito, desde o início desta aventura, que os voluntários são a força motriz deste projeto, cada um com a sua forma de pensar, de sentir ou de agir, mas todos com um mesmo propósito – cuidar. Às vezes vamos em esforço, outras vezes sentimos que podemos fazer mais, mas a verdade é que aos poucos fazemos a diferença para melhor. Esta é a realidade em Alcobaça, mas também em Leiria, na Marinha Grande, na Batalha, em Coimbra, em Pombal ou em qualquer outro lugar onde cheguem os Voluntários da Atlas, porque esta é a nossa essência.

Todos, formamos uma equipa incrível, uma equipa que se complementa e equilibra com as suas diferentes competências, disponibilidades ou energias. Uma equipa que se rege pelos valores em que acredita e que arregaça as mangas para mudar um mundo de cada vez.

Penso que todos concordamos com o facto de que aprendemos muito com esta experiência e que, apesar do tempo que oferecemos, o que recebemos de volta é muito mais valioso.

Obrigada a nós, todos, que fazemos acontecer, que acreditamos que vale a pena continuar e que recolhemos sorrisos por onde passamos.


Autora
Sílvia Marquês
Voluntária ATLAS. Coordenadora do Projeto Velhos Amigos em Alcobaça

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A senhora que folheava revistas de moda

Uma senhora, de idade avançada, veterana na vida, ocupava uma cadeira num recanto de um cabeleireiro. Parecia esquecida como um candeeiro baço ou como a própria cadeira que ocupava, como se não tivesse vida. E ela que tinha tanta! Ao seu lado, no chão, repousava a sua bengala, a sua perna mais nova, mais firme, que lhe permitia o apoio nos movimentos.

O seu cabelo de neve escorregava por baixo de um barrete preto, que tapava o frio e os fios finos. Também tapava a vaidade que, a partir de certa idade, passa a ser uma raridade. A sua cara riscada de linhas exibia uma cor clara, porém manchada aqui e acolá. A sua silhueta pesava para a sua idade, por isso o recurso à bengala e à cadeira. Os seus olhos, tapados por umas cortinas espessas espelhavam doçura e apenas deitavam brilho.

Depois de pegar na sua bengala e de a encostar junto a si, fixou os olhos numa revista colorida. Quis entreter-se. Queria ver que fotografias mostrava do mundo. Pegou nela, com a sua mão já um pouco trémula, e começou a fazer passar as páginas pelos dedos. As caras eram todas lisas e cobertas de cores diversas para realçar os olhos e os lábios. Havia cabelos que deslizavam, outros que saltitavam e ainda outros armados em trabalhos elaborados.

As roupas eram vistosas e coloridas e deixavam adivinhar silhuetas todas magras, firmes e jovens.

Folheou a revista até ao fim e depois apenas disse:

– “Isto é só para os novos!”

E era. Também a revista parecia esquecer-se dela com aquela idolatria toda ao corpo jovem, modelado. E as outras revistas pareciam ser todas iguais. Não havia nenhuma que apresentasse silhuetas mais frágeis e mais volumosas. Não se vislumbrava qualquer sinal de cabelos brancos e finos. Nenhuma procurava embelezar uma cara riscada de rugas. Nenhuma sequer procuraria retratar um sorriso verdadeiro, daqueles que só vêm das pessoas que só se riem quando querem.

Depois de proclamar a sua crítica, atirou a revista para dentro do cesto (de onde tinha saído) e continuou na sua cadeira. Sentada. À espera.

Ninguém ligou. Ninguém ouviu. Continuou tudo na mesma. O secador continuou a alisar cabelos com a ajuda das escovas e as conversas acompanhavam a imagem que ia aparecendo no espelho.


Autora
Celina da Costa Gameiro
Residente em S. Simão de Litém, concelho de Pombal. Licenciada em Línguas e Literaturas modernas, variante de estudos franceses e ingleses, pela FLUC. Ouvinte e observadora. Voluntária na Atlas, no projeto Velhos Amigos.

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Uma Páscoa Gastronómica, região centro

A Páscoa é, das celebrações Católicas, a mais importante. Não só pelas festividades associadas ao fim da Quaresma como também porque marca o início de um novo ciclo, um ciclo de fertilidade, de renovação e vida abundante. Muito do simbolismo pascal, projeta-se nas práticas alimentares, gastronómicas e etnográficas que vivenciamos por esta época.

Esta prática de associação entre o sagrado e o profano, no qual se encaixa também a gastronomia, reveste-se de um simbolismo que, no passado, teve muito mais importância que nos dias que correm. Um bom exemplo é a prática do consumo do borrego ou cabrito nesta época festiva, dependendo da região. Este consumo retrata-se na prática dos Hebreus que na Páscoa sacrificavam um cordeiro em honra de Jesus Cristo, que também havia dado a sua vida para libertar o seu povo. Esta prática alimentar e gastronómica no fim da Quaresma, estava normalmente circunscrita à celebração da Páscoa, a um Batizado, Casamento ou outra festa de maior importância das famílias. Era habitualmente com um animal de aproximadamente um ano que se faziam maravilhosos cabritos e borregos assados no forno, em ensopados ou caldeiradas.

A prática de aguardar pelos momentos festivos para consumir determinadas iguarias, perdeu-se.

Com a popularização dos restaurantes gastronómicos, que destacam e dão palco ao melhor da culinária local, a produção em escala para o comércio de retalho, a democratização dos preços e o acesso a bens alimentares até então limitados a determinadas épocas, permitem que hoje se possa adquirir e confecionar todo o tipo de ingredientes em qualquer época do ano.

A Região Centro tem tudo o que precisamos

A Região Centro de Portugal não é exceção a este movimento de mudança no paradigma alimentar e, por conseguinte, conseguiu popularizar muitas das iguarias gastronómicas associadas à quadra da Páscoa. Alguns desses bons exemplos são a famosa Chanfana da Chainça, lugar onde a cabra e os seus rebanhos ganham destaque, providenciando o cabrito na quadra da Páscoa. Mas também o Leitão da Boavista, que, há boleia dos grandes centros de produção e abate da freguesia, se popularizou bastante com alguns restaurantes a fazerem fronteira com a EN1/IC2 há várias décadas. É, de resto, com a melhoria das estradas, dos meios de transporte e o aumento da circulação de pessoas que toda esta gastronomia mais circunscrita se popularizou, e ainda bem.

Para esta quadra escolho o Leitão à Boavista

Escolho o Leitão à Boavista por razões de ordem pessoal, é o meu prato gastronómico de eleição, e nutricionais, porque não devemos excluir a gastronomia local da nossa alimentação, antes moderar na quantidade e apostar na diversidade. No caso do leitão, por ser fornecedor de gordura em grande quantidade, devemos reservar apenas para dias especiais, enaltecendo a sua riqueza gastronómica em momentos de verdadeira festividade. E, querendo fazê-lo em casa, compraria uma assadeira de Barro da Bajouca, daquelas que dão para deixar leitão suspenso. Preparava uma pasta de alho pisado no almofariz, com sal da Figueira da Foz e pimenta em grão (branca e preta), à qual juntaria depois banha de porco. Logo barrava o leitão com o preparado, recheando o seu interior com metade da pasta de tempero (fechando com agulha e linha a barriga). Por baixo do leitão deixaria batatinhas novas com casca, apenas cortadas pela metade. Levaria a assar em forno bem quente, tendo o cuidado de não deixar assar demasiado as batatas (uma folha de couve a tapar lá mais para o final), cerca de 1h15 a 1h30 para um leitão de 4 a 5kg. Esta iguaria especial da nossa região acompanha bem com uns grelos ou nabiças cozidas, ou uma salada de várias verduras que tenham muita cor a lembrar a primavera, cheia de cor e sabor.

Boa Páscoa com boa gastronomia!


Autor
Rui Lopes
Nutricionista e Voluntário no Projeto Velhos Amigos

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Envelhecimento e Proteção Social

O envelhecimento é um processo complexo que ocorre ao longo de toda a vida, que envolve aspectos de vária ordem, como demográficos, económicos, sociais e familiares e que, tendo em conta a forma de envelhecer, não pode ser visto, apenas, no âmbito biológico.

No conceito de envelhecimento, deve considerar-se a idade cronológica, a jurídica (relacionada com direitos e deveres da sociedade), a psicoafectiva (relacionada com a personalidade e emoções), a social, e a biológica e física (ligadas ao ritmo de envelhecimento individual). Cada idoso é um ser único que envelhece ao seu ritmo, sendo este processo heterogéneo. Este processo e ritmo variam com base, por exemplo, no estilo de vida, alimentação, escolaridade, profissão exercida, etc. O idoso tem mais vivências, anos de vida, doenças, perdas, tempo disponível e sofre de preconceito! Assim, este processo de envelhecimento não deve ser considerado uma tragédia individual e, muito menos, colectiva, pelo facto de o idoso ter perdido o seu papel produtivo na sociedade!

Consequentemente, os idosos, dada a sua vulnerabilidade, estão mais sujeitos à discriminação social, levando a que, por vezes, se encontrem abandonados, em perigo, alvo de violência e falta de respeito pelos seus direitos!

Para que tal seja minimizado, foi necessário a adoção e criação de modelos de intervenção a nível familiar, social e de cuidados de saúde, devidamente enquadrados  juridicamente, para garantir o “envelhecer” com dignidade, segurança e respeito pela vida do idoso, modelos estes que se devem adequar à natural e “moderna” evolução do próprio envelhecimento, priorizando, sempre, os direitos individuais e o respeito pela pessoa idosa! Criaram-se, assim, Comissões de Proteção de Idosos, creio serem, em Portugal,19! Estas Comissões pretendem garantir o que referi atrás, mas, caso esses direitos estejam, ou sejam, ameaçados, e não respeitados, o recurso ao Ministério Público, permite-lhe, por legitimidade, agir!

Envelhecer com dignidade e direitos

Dado haver, socialmente, défice generalizado de conhecimento do universo jurídico, acentuado nos idosos, acompanhado, na maioria dos casos, de carência económica, dependência física e psicológica, é necessário que todos nós estejamos atentos e defendamos os direitos da pessoa idosa, fazendo-os respeitar, exigindo à sociedade que, igualmente, os respeitem, recorrendo, se necessário for, à via judicial, pois, nem sempre a pessoa idosa, devido a tudo o que foi sendo referido, se consegue defender! Esta atenção deverá ser redobrada, uma vez que, de acordo com o último Censo, a estrutura etária da população Portuguesa evidencia, na respectiva pirâmide etária, um acentuado aumento da população idosa que assenta na diminuição da Natalidade e aumento da Esperança Média de Vida! Prevê-se que, segundo as projeções do INE, até 2060 o Índice de Envelhecimento aumente até aos 307 idosos por cada 100 jovens!

As instituições como a Atlas, deverão ter um papel importante de proteção social na defesa e denúncia destes direitos, devendo estar, particularmente, atentas ao direito a condições dignas de habitação e respectiva  acessibilidade, aos cuidados de saúde, bem estar e segurança de todos os casos que conheça, e, em particular, aos dos seus Beneficiários, pugnando pela efectivação de todos esses seus  direitos!  Assim o temos feito na Atlas e, dada a nossa persistência, temos sido bem sucedidos!


Autora
Isabel Guimarães
Voluntária, Coordenadora do Projeto Velhos Amigos em Leiria

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Matiné do Riso

No passado dia 20 de março, Dia Internacional da Felicidade, no que era suposto ser uma tranquila tarde de sábado, fui sobressaltado por uma iniciativa da equipa da ATLAS que nos presenteava com uma Matiné do Riso. A sessão seria facilitada por José Santos, Embaixador do Yoga do Riso em Portugal, e a assistência era desde logo convidada a não se inibir de soltar muitas gargalhadas! Mas, perguntarão os caros leitores, porquê o sobressalto? Por causa do “ioga do riso”.

Para mim, um ignorante nesta matéria, ioga é uma prática meditativa associada a exercícios físicos que esticam até aos limites (!) os músculos, tendões, nervos, articulações, tudo num ambiente de grande calma e infinita placidez. Como seria possível rir nestas circunstâncias? Na melhor das hipóteses, a ideia de estalar articulações e repuxar músculos poderia, quando muito, provocar risos nervosos! Confesso que tinha hesitado em me inscrever na sessão. Mas… a atração pelo abismo foi muito grande e lá fui à sessão… era em Zoom e, enfim, havia sempre a possibilidade de haver uma falha de comunicação mesmo a propósito…

Lá fui… e ri-me muito,

mesmo sem ter saído da cadeira!

Ri-me eu, e riu-se a assistência composta por beneficiários, simpatizantes e voluntários que preenchia bem a “sala” do Zoom. E rimo-nos de quê? Do riso! Sim, rimo-nos do riso! A sessão, muito animada e entusiasticamente conduzida por José Santos, constava essencialmente de exercícios físicos (leves, leves, aah, deste ioga gosto eu!) acompanhados pela vontade de cada um de nós rir, porque rir é o que queríamos fazer naquele momento, porque rir é bom, porque rir não paga IVA, rir porque sim, rir porque num tempo onde tantas ideias são atualizadas, podemos atualizar o clássico ditado “quem canta seus males espanta” para “quem faz ioga do riso sua vida leva com um sorriso”. Estou a ser demasiado otimista? Talvez, mas riso a riso vai a vida enchendo o papo!

Ficou o sorriso de cada um de nós.

E, sobretudo, caros leitores, ficou o sorriso de cada um de nós no fim da sessão! Como foi bom sentir que uma assistência tão alargada tinha partilhado momentos agradáveis e de muita cumplicidade! Sim, cumplicidade, porque rirmo-nos uns para os outros, muitas vezes sem nos conhecermos, apenas porque queríamos todos rir, sim, foi um exercício de cumplicidade radical! Deste fim de tarde, ficou em mim, e creio que na assistência, a recordação da felicidade de uma tarde de riso partilhada!

Mas afinal o que é o ioga do riso? Agora sim, rio de nervoso, mesmo estando apenas sentado na cadeira donde escrevo, sem ter de fazer exercícios físicos que esticam até aos limites os músculos, tendões, etc.: Não sei o que é o ioga do riso! Mas sei que existe porque vivi-o mesmo que apenas momentaneamente! Prometo que numa próxima newsletter saberei do que agora escrevi! Até lá, não se inibam de rir sempre que possível, mesmo que seja apenas desta minha ignorância!

Sintam-se convidados e convidadas a conhecer mais sobre o trabalho do José Santos: aqui

Registo de um momento do Encontro ao Serão – Matiné do Riso, dinamizado por José Santos com voluntários, beneficiários e amigos da ATLAS – People Like Us.

Autor
Rui Bingre
Voluntário no Projeto Velhos Amigos

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