Este é um texto acerca de motivações para o voluntariado e de partilha de expetativas de vida entre duas voluntárias… a voluntária da Atlas com mais anos de vida e eu, com cerca de metade da sua idade.
O Rui Bingre, editor da Newsletter, sugeriu-me conhecer a D. Fernanda e trocarmos ideias, jogando, precisamente, com as nossas idades.
A D. Fernanda é voluntária no Concelho de Pombal, desde o início da ATLAS neste território, em 2018. Eu sou voluntária em Leiria, desde 2014. O nosso caminho ainda não se tinha cruzado. Estava com muita curiosidade para conhecer esta senhora, que, fugindo ao expectável pela sua idade, não é beneficiária, mas sim voluntária!
O nosso encontro foi na delegação da ATLAS, em Pombal, e lá me aguardava, à porta, com um sorriso muito ternurento e de forma tranquila, a querida D. Fernanda.
Demo-nos a conhecer. A D. Fernanda tem 90 anos, é mãe de três filhos e avó de dois rapazes, o seu marido faleceu há 33 anos. Estudou na Escola do Magistério Primário e foi Professora Primária. Eu tenho 42 anos, sou casada, mãe de uma menina, estudei Psicologia e sou formadora, em Educação e Formação de Adultos.
Foi interessante descobrirmos afinidades, como o gosto em ensinar e a experiência de ser mãe por volta dos 30 anos. E o que faria a D. Fernanda se, agora, tivesse a minha idade? E a sua resposta foi deliciosa de ouvir: “Não mudava nada. Aos 40 anos há que olhar para o que temos e somos. Foi o ano das grandes decisões: ter ou não mais filhos? Ter ou não casa própria?” Incrível, disse-lhe eu! As questões de vida com que a D. Fernanda se deparou, aos seus 40 anos (então, na década de 70) eram as mesmas para mim (cinco décadas mais à frente, em 2020)… E quais foram as respostas? Iguais para as duas: não ter mais filhos e adquirir casa própria. A D. Fernanda não mudaria nada, porque de forma ativa, em família, tomaram o rumo necessário, em coerência com as suas decisões.
Neste “jogo” de nos vermos com a idade uma da outra, expressei o quanto gostaria de, também aos 90 anos, poder agir como a D. Fernanda: com alegria de viver, tendo uma vida diária na qual me fosse possível conviver com o grupo de amigos e com a família e estar ativa, por exemplo, num voluntariado.
As motivações para se ser voluntária são as mesmas, aos 42 e aos 90 anos: interesse pelas pessoas e pelo meio que nos rodeia, querendo ajudar e contribuir para o bem-estar dos outros e gosto em conviver. Para a D. Fernanda acresce o facto de ser importante sentir-se ativa, na sua comunidade, como forma de não se isolar. Então, aprecia o facto de as pessoas que vai conhecendo no voluntariado (os outros voluntários e os beneficiários) mostrarem estima por si, por ser participativa, e sente-se grata por ser capaz de o fazer. Como disse a D. Fernanda: “Nesta idade, as pessoas darem-me valor é muito importante para mim, é quase que uma vaidade, é uma satisfação”.
Obrigada pela partilha, D. Fernanda, e obrigada por continuar a dar de si aos outros!
Autora:
Sofia Carruço
Psicóloga e Voluntária na Atlas em Leiria.
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