Notícias

O Projecto Radices


Quando a Drª Irene Bingre do Amaral me abordou, para me apresentar um Projeto que estava a acarinhar eu logo soube que seria algo muito significante e aliciante, como todos os projetos em que se envolve. A proposta que me apresentou ia ao encontro dos propósitos do projeto Cultural do Agrupamento de Escolas D. Dinis que coordeno, no âmbito do Plano Nacional das Artes.

O Plano Nacional das Artes, desenvolvido pelas áreas governativas da Cultura e da Educação, tem como objetivo “tornar as artes mais acessíveis aos cidadãos, através da comunidade educativa, promovendo a participação, fruição e criação cultural, numa lógica de inclusão e aprendizagem ao longo da vida. Pretende incentivar o compromisso cultural das comunidades e organizações e desenvolver redes de colaboração e parcerias com entidades públicas e privadas.”

Ora, no âmbito do Plano Nacional das Artes, o Agrupamento de Escolas D. Dinis desenvolvia um Projeto Cultural de Escola que assentava na Cultura Popular Portuguesa e, em especial, na nossa região, o qual designou por “CULTURA imPOPULAR – reabilitar tradições”.

Pretendia essencialmente centrar a sua atenção nos costumes, crenças, lendas, músicas, artefactos e memórias que representassem uma identidade comunitária. Pretendia combater o esquecimento de algumas manifestações da cultura de origem popular, pouco celebradas nas nossas escolas e que são identitárias. Pretendíamos assim, uma reabilitação e não apenas recuperação, cientes de que “o progresso e as mudanças que ele provoca podem tanto enriquecer uma cultura como destruí-la para sempre.”, como nos alerta a UNESCO, Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura.

Ouro sobre azul, ficámos muito agradados pelo facto de, numa convergência de propósitos, podermos concretizar parte dos nossos objetivos com o Projeto RADICES, numa honrosa colaboração com o Atlas, e que promoveu o encontro de duas distantes gerações. Os mais velhos, trouxeram então ao juvenil Grupo do Clube das Artes/PCE, a Cultura Popular/Impopular e numa voz, procurou-se recuperar e renovar algum artefacto moribundo.

Iniciou-se assim uma conversa à volta de extravagantes artefactos e conceitos, aos ouvidos dos mais novos, como selhas, cântaros, alqueire, meio alqueire, quarta … peneiras (eu também aprendi a diferença entre uma vulgar peneira e um crivo), maceiro, malho da debulha, ocarina, etc, invocando saudosas recordações e afetos e fazendo germinar também novos afetos entre os presentes. Feito o brainstorming que em português, com boa vontade se traduz por cavaqueira, elegemos o nosso objeto/artefacto – a peneira de madeira.

Importava agora reabilitá-la. Para tal, recorreu-se às técnicas de tecelagem, que os alunos já conheciam, e que recordámos num pequeno exercício realizado por todos, em papéis com cores vibrantes.

Os mais afoitos, empunharam berbequins – os documentos fotográficos atestam a sua bravura – e perfuraram peneiras fazendo delas teares que receberam coloridos fios de trapilho, onde se exploraram paletas cromáticas, laços e nós diversificados. Esta equipa intergeracional, fardada com aventais personalizados, uma intervenção serigráfica que contou com o apoio do artista António Palmeira, nas instalações do Instituto Português do Desporto e Juventude, deu asas à imaginação.

As nossas peneiras ficaram tão vaidosas que logo foram batizadas de Peneirentas.

Nascidas e apadrinhadas, logo reclamaram a sua independência e rumaram a outros territórios. No atelier da escola, ficaram alguns fios espalhados a fazer desenhos de rastos, talvez dos barquinhos de origami que todos fizemos no dia em que içamos as nossas âncoras e iniciámos esta viagem. Também os nossos alunos, maioritariamente do 9º ano, zarparam para o ensino secundário. Ficaram as mesas semivazias. Ficou o cheirinho de queques a lembrar a partilha, a dádiva, e o feliz reencontro de gerações. Em nome do Agrupamento, agradeço esta boa memória e a experiência enriquecedora que foi proporcionada aos nossos alunos.

Autora: Isabel Lourenço

Professora de Artes Visuais

Coordenadora do Plano Nacional das Artes no Agrupamento de Escolas D. Dinis, Leiria

Coloque um comentário